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Na “nobreza de uma árvore”, a vida e obra de Eugénio de Andrade permanece eternizada

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É nos Jardins do Palácio de Cristal, “lugar mágico onde o universo lírico do poeta ressoa intensamente”, observou Rui Moreira, que, desde sábado, mora uma tília batizada com o nome de Eugénio de Andrade. O tributo ao escritor, protagonista da 11.ª edição da Feira do Livro, eterniza “na nobreza de uma árvore a extraordinária vida e obra” do homenageado, que passou uma grande parte da sua existência na cidade do Porto. Está, agora, de regresso a “casa”.

“Que melhor sítio haveria para evocar o poeta?”, questionou o presidente da Câmara do Porto, que, nos Jardins do Palácio de Cristal, se juntou aos admiradores de Eugénio de Andrade para o recordar. Num ambiente onde avultam árvores, plantas, flores e aves – elementos da natureza sublimados na obra do escritor –, foi atribuída uma tília de homenagem ao poeta, que num dos seus versos pressagiou: “Árvore, árvore. Um dia serei árvore”.

Na “nobreza de uma árvore”, onde agora consta o nome do escritor, foi eternizada a “vida e obra de Eugénio” para que o seu legado continue vivo na memória coletiva de todos os que visitarem o local, notou Rui Moreira. O presidente lembrou que o poeta “tinha uma especial predileção por árvores”, usando “a força evocativa e estética” destes elementos “para escrever alguns dos melhores poemas em língua portuguesa”.

Andreia C. Faria, comissária da homenagem a Eugénio de Andrade, contou uma curiosidade que elucida na perfeição a ligação do autor a estes elementos. “Quando estava perto de fazer 80 anos, Eugénio pediu como presente algo muito simples: que lhe plantassem um plátano em frente a casa”, recordou a poeta, demonstrando a admiração que o autor tinha por estas plantas.

Eugénio teria seguramente gosto em emprestar o seu nome a uma tília

Por isso, Rui Moreira não tem dúvidas: “Eugénio teria seguramente gosto em emprestar o seu nome a uma tília. Mais ainda a uma tília dos jardins do Palácio de Cristal, lugar mágico onde o universo lírico do poeta ressoa intensamente”, salientou o autarca portuense. O presidente saudou ainda “o regresso” do autor a um lugar que também lhe pertence.

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Apesar de o Fundão ter sido o berço de Eugénio de Andrade, o poeta viveu na cidade do Porto durante uma parte da sua vida, tendo sido na Invicta que teve a sua última morada. É por isso que “aqui, Eugénio está em casa. Está no “seu” Porto”, frisou Rui Moreira.

Por conhecer tão bem as gentes e os costumes portuenses, “o poeta conseguiu compreender e traduzir a singular forma de ser, agir e pensar desta cidade”, enalteceu o presidente, defendendo que “há fundadas razões para que o Município preste homenagem a Eugénio de Andrade, decorridos que estão 100 anos do seu nascimento”.

Ao celebrar “condignamente um dos mais notáveis escritores do nosso tempo”, a Feira do Livro do Porto 2024 quer ecoar “uma voz inconfundível da poesia portuguesa”, vincou Rui Moreira. Contudo, as homenagens municipais ao escritor não se restringem às duas semanas em que decorre o festival literário.

Já em 2022, o Município assinou com a Universidade do Porto um protocolo para a transferência do espólio de Eugénio de Andrade para que este fosse incorporado no acervo da Casa dos Livros – Centro de Estudos da Cultura em Portugal, onde, como reavivou Rui Moreira, “está devidamente depositado e pode ser consultado de forma organizada e funcional”.

Por ocasião do centenário do nascimento de Eugénio, em 2023, a autarquia também adquiriu os espólios literários e artísticos sobre o poeta. Agora, estas obras podem ser admiradas na exposição “Post Scriptum Sobre a Alegria”, que, no primeiro dia da feira, foi inaugurada na Biblioteca Municipal Almeida Garrett.

Em breve, também vai ser inaugurada, na última morada do poeta, a Biblioteca de Poesia Eugénio. No local, situado no Passeio Alegre, vão constar não só as obras do poeta, mas também livros de autores que pertencem ao seu universo literário.

Enquanto isso, Eugénio de Andrade fica imortalizado na Avenida das Tílias, juntando-se a outros grandes nomes da literatura portuguesa, como Manuel António Pina, Vasco Graça Moura, Ana Luísa Amaral ou Sophia de Mello Breyner Andresen.

Importa ler Eugénio hoje recuando até aos primeiros livros

“Eugénio teria apreciado a tília que o Município acaba de lhe atribuir”, opinou Andreia C. Faria, ao dar continuidade à homenagem ao “poeta da luz”, que prosseguiu no auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garrett.

A conversa “Arco e Flecha: Temas de Eugénio hoje”, que contou com a moderação de Joana Meirim, juntou a poeta Elisabete Marques, a biógrafa Inês Lourenço, o investigador Ricardo Marques e a professora Rosa Maria Martelo, num momento em que os presentes reafirmaram que, quase duas décadas após a morte de Eugénio de Andrade, as dimensões da sua obra permanecem mais vivas do que nunca.

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“Importa ler Eugénio hoje recuando até aos primeiros livros. Nesse movimento de regresso confirmamos os seus grandes temas: a infância, o corpo em confluência com a natureza, o encontro amoroso, a dignidade da experiência humana, a recusa de um entendimento do ser enquanto mero projeto técnico otimizável”, reavivou a comissária da homenagem ao poeta.